A concessão de prisão domiciliar a presos que são pais ou mães de crianças menores de 12 anos tem sido tema recorrente nos tribunais brasileiros, especialmente após importantes decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF). O tema envolve a proteção integral da criança e o direito à convivência familiar, conforme prevê a Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Prisão domiciliar para mulheres: dispensa de comprovação da necessidade dos cuidados
Em agosto de 2022, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que mulheres presas, que sejam mães de filhos menores de 12 anos ou responsáveis por eles, têm direito à substituição da prisão preventiva pela domiciliar, independentemente da comprovação da necessidade de cuidados maternos. A simples existência do vínculo materno com criança nessa faixa etária já é suficiente para a concessão da medida.
De acordo com a ministra Laurita Vaz, relatora no Recurso em Habeas Corpus (RHC) 158.580, o benefício decorre diretamente do artigo 318, inciso V, do Código de Processo Penal (CPP), alterado pela Lei nº 13.257/2016, que instituiu o Marco Legal da Primeira Infância (STJ, 2022).
Fonte: STJ, “Regime domiciliar para presa com filho de até 12 anos não exige prova da necessidade de cuidados maternos”, 02/08/2022, disponível em: https://www.stj.jus.br. Consulta em 30/05/2025.
O entendimento do STJ é de que “não se pode exigir da mãe, ou da gestante, que comprove a imprescindibilidade dos cuidados”, bastando a demonstração da condição de responsável por filho de até 12 anos (Conjur, 2024).
Fonte: Conjur, “Ter filhos menores de 12 anos já garante prisão domiciliar à mulher, diz STJ”, 20/08/2024, disponível em: https://www.conjur.com.br. Consulta em 30/05/2025.
A proteção da infância como fundamento da medida
O STF também já se manifestou nesse sentido, destacando que a adoção da prisão domiciliar visa assegurar os direitos fundamentais das crianças, especialmente o direito à convivência familiar, conforme estabelece o artigo 227 da Constituição Federal.
Segundo o ministro Gilmar Mendes, em decisão proferida em janeiro de 2025, “a medida não se trata de um benefício à mãe, mas sim de uma proteção à criança”, destacando o caráter humanitário e social da medida (Agência Brasil, 2025).
Fonte: Agência Brasil, “Mães de crianças menores de 12 anos poderão cumprir prisão domiciliar”, 01/2025, disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br. Consulta em 30/05/2025.
Requisitos legais e jurisprudenciais
A possibilidade de substituição da prisão preventiva pela domiciliar encontra respaldo no artigo 318 do CPP, que prevê:
“Art. 318 – Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:
(…)
V – mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;
VI – homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos.”
Além da previsão legal, a jurisprudência consolidou o entendimento de que não se exige comprovação da imprescindibilidade dos cuidados para as mulheres. Para os homens, no entanto, o requisito adicional é que sejam os únicos responsáveis pelos cuidados da criança, conforme determina expressamente a lei.
Fonte: Jurídico.AI, “Prisão Domiciliar: Requisitos e Como Funciona”, 2025, disponível em: https://juridico.ai. Consulta em 30/05/2025.
Prisão domiciliar para homens: necessidade de comprovar ser o único responsável

Embora a lei também preveja a concessão de prisão domiciliar ao homem responsável por filho menor de 12 anos, há uma diferença relevante: é necessário comprovar que ele é o único responsável pelos cuidados da criança.
Em decisão paradigmática, o STJ autorizou, em 2021, a prisão domiciliar a um pai que era o único responsável por seus filhos pequenos, ressaltando a necessidade de que esta condição seja devidamente demonstrada no processo.
Segundo o ministro Rogerio Schietti Cruz, relator do caso, “a previsão legal busca resguardar o interesse superior das crianças e adolescentes, permitindo que, na ausência da mãe ou de outro responsável, o pai possa cumprir a prisão em regime domiciliar, evitando a ruptura do vínculo familiar” (Conjur, 2021).
Fonte: Conjur, “STJ autoriza domiciliar a pai responsável por filhos pequenos”, 26/12/2021, disponível em: https://www.conjur.com.br. Consulta em 30/05/2025.
Limites e exceções
Apesar das previsões legais e do entendimento jurisprudencial favorável, a concessão da prisão domiciliar não é automática. O juiz deve analisar se estão presentes os demais requisitos legais para a concessão ou manutenção da prisão preventiva, como o risco à ordem pública, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal.
Além disso, a medida não se aplica a casos de crimes praticados com violência ou grave ameaça à pessoa, ou em situações em que a substituição da prisão não se mostre adequada ao caso concreto, conforme orientação consolidada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Habeas Corpus Coletivo nº 143.641.
Fonte: TJMS, “Jurisprudência Comparada: Prisão Domiciliar – Filho Menor de 12 Anos”, 2017, disponível em: http://segundainstancia.ms.def.br. Consulta em 30/05/2025.
A evolução legislativa e jurisprudencial brasileira demonstra uma crescente valorização dos direitos da criança e do princípio da dignidade da pessoa humana. A concessão de prisão domiciliar a mães e, excepcionalmente, a pais de crianças menores de 12 anos, visa garantir a preservação dos laços familiares e o desenvolvimento saudável da criança.
Contudo, é importante ressaltar que cada caso deve ser analisado à luz das suas especificidades, sempre ponderando a proteção da sociedade e o respeito aos direitos fundamentais.
Sabia que?
O Habeas Corpus Coletivo nº 143.641, julgado pelo STF, reconheceu o direito à prisão domiciliar para mães e gestantes em situação de vulnerabilidade, reforçando o papel da jurisprudência na proteção da infância.
OPINIÕES FAVORÁVEIS À CONCESSÃO DA PRISÃO DOMICILIAR
1. Proteção integral da criança
Os defensores da concessão destacam que o foco principal não é beneficiar o preso, mas sim proteger o direito fundamental da criança à convivência familiar, conforme previsto no artigo 227 da Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). A presença da mãe (ou do pai, quando for o único responsável) é considerada essencial para o desenvolvimento emocional e psicológico da criança.
Fonte:
- STF, Habeas Corpus Coletivo 143.641, relator: Ministro Ricardo Lewandowski, 20/02/2018.
- Agência Brasil, “Mães de crianças menores de 12 anos poderão cumprir prisão domiciliar”, 2025.
2. Efetivação do Marco Legal da Primeira Infância
Com a promulgação da Lei nº 13.257/2016 — o Marco Legal da Primeira Infância —, passou-se a privilegiar políticas públicas e decisões judiciais que visam assegurar o desenvolvimento saudável das crianças nos primeiros anos de vida. A concessão da prisão domiciliar está em consonância com essa política legislativa.
Fonte:
- STJ, “Regime domiciliar para presa com filho de até 12 anos não exige prova da necessidade de cuidados maternos”, 02/08/2022.
3. Superação do encarceramento em massa de mulheres
Organizações de defesa dos direitos humanos apontam que a concessão da prisão domiciliar é uma medida importante para combater a superlotação carcerária e o impacto desproporcional do encarceramento sobre mulheres em situação de vulnerabilidade social, muitas delas únicas responsáveis pelo cuidado dos filhos.
Fonte:
- Instituto Terra, Trabalho e Cidadania (ITTC), “Mulheres, Crianças e Prisão: o Habeas Corpus Coletivo como avanço para direitos humanos”, 2019.
4. Humanização da execução penal
Defensores também argumentam que a prisão domiciliar é uma forma de humanizar o sistema penal, evitando que crianças sejam separadas de seus pais ou responsáveis, o que pode gerar traumas irreversíveis.
Fonte:
- Conselho Nacional de Justiça (CNJ), “Audiência pública debate alternativas penais para mães e gestantes presas”, 2023.
OPINIÕES CONTRÁRIAS À CONCESSÃO DA PRISÃO DOMICILIAR
1. Risco de impunidade e de reincidência
Críticos sustentam que a concessão automática de prisão domiciliar pode gerar um sentimento de impunidade e estimular a prática de crimes por pessoas que sabem que poderão ter o regime atenuado em razão da condição de pais ou responsáveis. Além disso, temem que a prisão domiciliar não seja eficaz para conter a reiteração criminosa.
Fonte:
- Cezar Roberto Bitencourt, “Tratado de Direito Penal – Parte Geral”, 2022.
- Conjur, “Limites e riscos da concessão de prisão domiciliar: o equilíbrio entre proteção infantil e segurança pública”, artigo de opinião, 2023.
2. Dificuldade de fiscalização
Outra crítica é que a prisão domiciliar não assegura controle suficiente sobre o condenado, especialmente em casos de indivíduos que apresentem risco à sociedade. A fiscalização das condições do cumprimento da pena em domicílio é considerada difícil e onerosa para o Estado.
Fonte:
- Ministério Público Federal (MPF), Parecer em Habeas Corpus Coletivo 143.641, 2018.
3. Desvirtuamento da finalidade da prisão preventiva
Alguns especialistas defendem que a prisão preventiva tem como objetivos assegurar a ordem pública, a aplicação da lei penal e a conveniência da instrução criminal. Assim, a concessão da prisão domiciliar, mesmo diante da condição de pai ou mãe de criança menor de 12 anos, poderia comprometer tais finalidades se não for avaliada criteriosamente.
Fonte:
- Guilherme de Souza Nucci, “Código de Processo Penal Comentado”, 17ª edição, 2023.
4. Igualdade entre homens e mulheres
Alguns juristas apontam que a interpretação extensiva do benefício às mulheres — independentemente de comprovação da necessidade dos cuidados — pode configurar uma violação ao princípio da igualdade, pois, para os homens, a lei exige prova de que são os únicos responsáveis pelo filho.
Fonte:
- Conjur, “A constitucionalidade da diferenciação entre homem e mulher na concessão da prisão domiciliar”, artigo de opinião, 2024.
RESUMO DAS POSIÇÕES:
A FAVOR | CONTRA |
Proteção integral da criança | Risco de impunidade |
Efetivação do Marco Legal da Primeira Infância | Dificuldade de fiscalização |
Redução do encarceramento feminino | Desvirtuamento da prisão preventiva |
Humanização da execução penal | Violação ao princípio da igualdade |
Considerações finais
A concessão da prisão domiciliar a pais ou mães de crianças menores de 12 anos é um tema complexo que envolve a ponderação entre direitos fundamentais, interesses sociais e a eficácia do sistema penal. As decisões do STJ e do STF apontam para uma tendência de valorização da proteção da infância, mas as críticas indicam a necessidade de critérios claros e meios eficazes de fiscalização para garantir que a medida cumpra seu objetivo sem comprometer a segurança pública.